domingo, 15 de dezembro de 2013

John Wizards - John Wizards (Planet Mu)



Há algo de ligeiramente errado na música destes sul-africanos "John Wizards", como o relógio digital que se vislumbra no pulso de um actor numa recriação de época.
Um ligeiro sentimento de deslocação temporal e geográfico, como se Lusaka fosse um bairro de Detroit ou se Paul Simon tivesse usado um Mac Book artilhado com VCTs na gravações de Graceland.
A música congeminada por John Withers e Emmanuel Nzaramba é artificial e orgânica ao mesmo tempo, agitada e tranquila, futurista e retro, como se existisse num limbo, entre África e o espaço sideral.
O meu disco do ano!
Agora que ligo a televisão...nem a propósito...
 


(in, Blitz, 12-13)

sábado, 28 de setembro de 2013

Pop para sonhar a dançar!

Chama-se "II" e é o novo disco de Moderat que acaba agora de chegar às lojas com a chancela da Monkeytown.
Nesta segunda investida do trio Moderat, projecto que associa Modeselektor (Sebastian Szary e Gernot Bronsert) a Apparat (Sascha Ring), observa-se uma depuração sonora em relação ao álbum de estreia de 2009, com a música a oscilar entre cenários hedonistas tipicamente pop e um irresistível apelo à dança.
Por entre melodias elegantes sente-se a fúria, com os subgraves e as ambiências industriais em alta, além dos horizontes lunares e da fantasia, identificando-se sempre pormenores não enunciados, difíceis de decifrar, com a voz de Ring a revelar-se um dos elementos preponderantes de um todo, onde os fantasmas de Burial e do tecno de Detroit se fazem sentir com intensidade.
A introspecção e o minimalismo de Apparat combinam com a rugosidade do tecno e electro dos Modeselektor, convertendo-se em algo que é muito mais do que uma mera soma de partes e funciona em pleno. 

domingo, 14 de julho de 2013

Van Dyke Parks - Songs Cycled

Imagina-se que enquanto em Nova Iorque, durante a lei seca, os sons de Duke Ellington fossem os eleitos dos priveligiados que frequentavam espaços como o Cotton Club, algures num ambiente similar de Los Angeles o que se escutaria seria algo muito semelhante ao que Van Dyke Parks propõe em "Songs Cycled", agora editado pela Bella Union.
Um álbum em que reúne material disperso por singles editados na sua própria etiqueta, Banistan, ao longo de tempos mais recentes.
Vaudeville feito de violinose acordeões com ecos de composições populares e farrapos de trabalhos anteriores de Parks.
Ouve-se "Songs Cycled" e imagina-se também o que teria sido o primeiro álbum dos Belle Chase Hotel se Parks também estivesse no estúdio.
Engraçado!





(in Blitz, RMA)

domingo, 30 de junho de 2013

I Hear A New World



"Globbots", "Bribcots" e "Saroos", "space boats", " magnetic fields" e "orbits"...
Só pelas palavras usadas nos títulos já dá para perceber que, de facto, Joe Meek ouvia um mundo novo quando na década de 60 ainda não tinha dado ao mundo os Beatles e George Martin ainda não tinha entendido plenamente as potencialidades do estúdio.
Joe Meek estava à frente!
Fascinado pela promessa do espaço que os primeiros foguetões e satélites anunciavam, Meek usou a imaginação e uma normalíssima banda de skiffle para no seu apartamento criar uma obra que ajuda a explicar muita coisa na pop.
Originalmente editado em 1960, "I Hear A New World", acaba agora de ver a luz de novo sob tutela da Cherry Red.
Reverbs, delays e loops ao serviço de uma visão excêntrica  que transforma ecos de country e de easy listening havaiano numa pop literalmente extraterrestre.
Meek teria um fim trágico depois de recusar trabalhar com os Beatles e David Bowie, e a sua vida deu mesmo origem a um filme.
Um bravo para todas as editoras que acreditam que vale a pena reeditar um disco, mesmo que tenham passado muitos anos.
Mais um para a prateleira dourada da Xangai deste ano.



(adpt., Blitz 06/13, RMA)

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Shaking The Habitual



É impossível não ler nos tons sombrios da música electrónica produzida actualmente por gente como Raime, Haxan Cloak ou Demdike Stare um comentário aos dias igualmente sombrios que o capitalismo mundial atravessa.
De regresso, 7 anos após "Silent Shoit" e 4 depois do desvio Fever Ray, os The Knife dos irmãos Karin e Olof Dreijer acrescentam a esse comentário em curso nas margens mais experimentais da electrónica um discurso poético e conceptual apoiado em letras acusatórias e num anonimato militante que tem nas máscaras a mesma atitude combativa que se descobre nas manifestações que vão pontuando o colapso do ocidente.
E tudo isto surge envolto numa música de tons tribais, dissonante, onde a voz é mais um elemento numa barragem de ruído, como se os The Knife quisessem fazer música com os detritos pop do século XXI.
"Shaking The Habitual", agora editado pela Coop.
Poderoso, intenso, difícil e completo!
Mais um para os 5 melhores do ano...e ainda nem a meio vamos...a coisa promete :)







(in, Blitz, Maio 2013, RMA)