São cada vez mais os cruzamentos entre a estética exploratória da música electrónica e a angularidade geométrica do jazz e, ainda que nem sempre com resultados admiráveis, a verdade é que em teoria essa formulação é atraente. Não só pelo lado de novidade que pode encerrar, mas também porque se trata de matizar quadrantes que, mesmo que distantes na origem, encontram no seu percurso histórico muitos pontos de contacto.
"You Can't Get There From Here" é um disco que demonstra, na prática, o quão estimulante esse rendez-vous pode ser e parte, até no título, da impossibilidade de unir todos os pontos de uma estrutura para outra para descobrir que, afinal, de duas dinâmicas por vezes opostas se pode conseguir uma variedade estética coerente, capaz de retirar a cada peça individual a contribuição exacta para um todo sublime.
De Scanner, o britânico Robin Rimbaud, já conhecíamos toda a sua vasta discografia, assente numa notória vontade de calcorrear todo e qualquer canto da música electrónica experimental.
Do americano David Rothembergdescobrimos agora a agilidade e concisão emocional com que usa o clarinete.
Juntos fizeram deste disco um caso sério de criação de um ambiente simultaneamente aveludado e rugoso, em que a tensão implícita em diversos momentos nunca encontra a chave de ignição para a eclosão de erupções catárcticas, mas desenvolve-se em progressivas dissoluções, como se desenhasse lentas formas a tinta negra vertida, gota a gota, num copo de água turva.
E assim "You Can't Get There From Here" surpreende por deixar que se vislumbrem caminhos que nunca chegam a ser explicitamente desenhados, mas cuja insinuação permite que cada um, a seu jeito, trate de expandir a gosto próprio.
Como se da impossibilidade se chegasse, com input do ouvinte, a uma infinidade de eventuais possibilidades.
E um disco assim tem a grande virtude de nunca deixar que a sua audição se esgote, clamando sempre por nova e reveladora viagem.
(in, Matéria Prima)
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