
Qual a razão desta confusão de sensações que nos provoca a música extrema da dupla Andrew Hung e Benjamin John Power? E confusão parece não descrever na totalidade o autêntico corropio desordenado de emoções a que somos acometidos a cada nova vertigem sonora que estrondosamente se desprende de «Street Horrrsing». É certo que, se por um lado toda a texturização sonora, espessamente hipnótica, se acomoda em longuíssimos acordes de teclados que se repetem até à infinitude, também é verdade que essa correnteza subtil parece arrastar consigo progressivamente todo um conjunto de inesperados objectos sonoros, contra os quais vamos chocando violentamente enquanto, distraídos, continuamos a centrar a atenção do doce e prolongado embalo melódico.
Neste percurso flutuante que «Street Horrrsing» desenha para os seus ouvintes, os arremessos brutais e aparentemente desordenados de fragmentos de magma sonoros - que podem ser vozes esquizofrénicas que nos gritam desde lugares inóspitos e inidentificáveis, ruídos imensos cuja presença só se revela verdadeiramente no exacto momento em que se torna abrupta ausência, batidas tribais e tribalizantes que colocam o sexto sentido em alerta para a catástrofe que há-de vir, ou inflamados rastilhos nihilistas de teclados em distorção - parecem querer erguer um novo paradigma civilizacional, surgido das sombras do pós-apocalipse, em que as silhuetas dos edifícios arrasados por uma qualquer guerra se destacam na linha do horizonte, desenhados a negro numa crepitante tela laranja-fogo.
Por isso vem à memória a asfixia repetitiva e claustrofóbica causada pelos Suicide, tolerada às vezes no limite da dor física, mas também a beleza frágil e oculta dos My Bloody Valentine, ou ainda a cumplicidade telúrica dos Animal Collective e a ritualização demencial dos Black Dice, num complexo jogo de equações aparentemente sem nexo e sem relação, mas cujo mínimo múltiplo comum parece ser o choque bombástico provocado nas fundações do edifício sensorial do ouvinte, que assim se refaz à luz de uma nova matriz, enriquecida por mais uma experiência-limite.
Por tudo isso os Fuck Buttons chegam, quatro anos depois de Bristol ter assitido ao seu nascimento, com um disco que será seguramente uma das melhores estreias do ano de 2008 e encimam as apostas para o desempenho mais surpreendente no SXSW do próximo verão.
Fuck Buttons - Street Horrrsing (ATP Records, 2008)
(Fonte: http://www.dominiodeuses.org/)
Sem comentários:
Enviar um comentário